domingo, 29 de abril de 2018

Conhecimento geral comum nos Estados Unidos


Nos Estados Unidos o Federal Circuit em decisão de 2012 em Mintz v. Dietz & Watson[1] entendeu que afirmações vagas de que uma reivindicação é óbvia em função do conhecimento geral comum são inaceitáveis ao menos que estejam suportadas em alguma evidência objetiva[2]. A obviedade deve se fundamentar em algo que foi realizado e não em algo que poderia ter sido feito. Se algo é considerado como parte do conhecimento comum geral então deve existir uma abundância de fontes para sustentar esta afirmação. O hábito de alegar obviedade sem se fundamentar em evidências objetivas é algo que tem sido criticado pelo Federal Circuit em decisões anteriores como em In Re Lee[3] ou In re Kahn[4]. O USPTO estabeleceu que um elemento ou combinação de elementos é considerado como bem conhecido, de rotina, ou convencional somente quando o examinador puder prontamente concluir que tal elemento é largamente prevalente (widely prevalent) ou de uso comum na indústria relevante. Em 2018 com o chamado Berkheimer memorandum esta análise de obviedade passou a ser considerada uma análise factual da mesma natureza que a análise usada em 35 USC 112(a) para saber se um elemento precisa ser detalhado no relatório descritivo para configurar uma situação de suficiência descritiva, ou seja, não basta ser conhecido do estado da técnica para algo ser enquadrado como well understood, routine and conventional. O USPTO abriu consulta pública em abril de 2018 para os critérios estabelecidos no Berkheimer memorandum[5]


[1] http://www.patentlyo.com/patent/2012/05/mintz-v-dietz-watson-hindsight-and-common-sense.html
[2] http://www.lexology.com/r.ashx?i=2892512&l=7GPAK8K
[3] In re Lee, 277 F.3d 1338 (Fed. Cir. 2002)
[4] In re Kahn, 441 F.3d 977 (Fed. Cir. 2006)
[5] https://www.gpo.gov/fdsys/pkg/FR-2018-04-20/pdf/2018-08428.pdf

Superação de preconceito técnico


O artilheiro inglês Robins em 1711 em seu livro Matemática contendo os novos princípios da artilharia apresentou sua invenção de raiar os canhões a fim de aumentar a sua precisão ao promover a rotação do projetil. No entanto, o grande matemático Euler argumentara contra a eficiência da medida, apesar dos experimentos concludentes apresentados. Esta opinião resultou no atraso da adoção desta invenção diante da autoridade de Euler[1]. No entanto, mesmo contra esta opinião de Euler a patente foi considerada inventiva pelos tribunais franceses e é apontada na literatura como exemplo clássico de invenção de meios.[2] Trata-se de um exemplo de invenção com superação de preconceito técnico estabelecido. Fletcher Pratt aponta que embora produzindo armas mais precisas, esta mesma solução fora proposta pelo fabricante de armas de Viena Gaspard Koller em 1520, no entanto, não alcançara popularidade pois em sua época era difícil trabalhar com metais duros e desta forma fabricar as raias, havia problemas na limpeza para remoção de resíduos de pólvora nas raias e além de ser difícil fazer com que um projetil penetrasse pelo cano de tal arma tornando o carregamento da arma bastante moroso.[3] No século XIX a Prússia derrotou a Áustria na Guerra dos Sete anos contando com avanços na tecnologia de armamentos entre as quais o fuzil de agulha Dreyse, nome derivado de seu percurso pontiagudo. Com o cano estriado, a nova arma era muito mais certeira do que os mosquetes de cano liso, ainda em uso na Europa. [4]


[1] MOUSNIER, Roland; LABROUSSE, Ernest. História Geral das Civilizações: o século XVIII: o último século do Antigo Regime, tomo V, v.1, São Paulo:Difusão Europeia, 1968, p.118
[2] POLLAUD-DULIAN, Frédéric , Propriété intellectuelle. La propriété industrielle, Economica:Paris, 2011, p.161; CHAVANNE, Albert; BURST, Jean-Jacques; Droit de la Propriété Industrielle, Précis Dalloz:Paris,1976, p.32
[3] PRATT, Fletcher. Famosos inventores e seus inventos, Rio de Janeiro:Record, 1964, p.94
[4] PARKER, Geoffrey. Senhores coloniais 1850-1900, Rio de Janeiro:Tme Life, 1992, p. 48

sábado, 28 de abril de 2018

Patente da pirâmide


Na ex Tchecoslováquia em 1959  engenheiro Karl Drbal teve uma patente concedida CZ 91.304 para  dispositivo de plástico em forma de pirâmide capaz de recuperar o fio de corte de lâminas de aço de barbear usadas. O princípio de funcionamento remonta antigas teses egípcias sobre as pirâmides construídas nos tempos dos faraós.[1] Karl Drbal  era um engenheiro de rádio aposentado e depositou sua patete em 1949, e durante os dez anos de exame junto ao escritório de patente teve de apresentar diversos dados experimentais e artigos que confirmassem o funcionamento do dispositivo: “inicialmente, quando requeri a patente, o fato se tornou quase uma piada para mim e meus amigos, engenheiros de rádio como eu, que me encorajaram a fazer o requerimento para ver como reagiria o Departamento de patentes expedindo uma patente sobre um aparelho de barbear do faraó”. Uma das recomendações é a de que a lâmina deve ficar com o seu eixo longitudinal na direção do componente horizontal do campo magnético da Terra. O modelo da pirâmide foi construído em papelão com 8cm de altura e 12,5 cm de linha de base (altura da pirâmide vezes π/2) mantendo as proporções da pirâmide egípcia de Quéops  e foi capaz de mostrar eu funcionamento para o engenheiro metalúrgico encarregado no exame que defendeu a concessão da patente junto à Comissão examinadora: “estou certo que, sem o auxílio desse honesto examinador, a <estranha> patente hoje não existiria”. Outras relações entre altura e base são capaz de afetar o fio da lâmina de barbear do mesmo modo. O inventor ressalta que o aparelho descrito não é um afiador mas um regenerador do fio de corte: “esta invenção foi testada especialmente para um aparelho na forma de pirâmide, mas não se limita a esta forma específica, significando que pode ser válida para outras formas geométrica de material dielétrico empregados tal como descrito na patente”. A invenção atua no sentido de modificar a estrutura microcristalina do bordo afiado que deve ser aço da melhor qualidade, removendo as moléculas bipolares da água dos vazios da estrutura cristalina do fio da lâmina por meio de uma ação ressonante sobre este dipolo, como se estivesse “desidratando “ a lâmina de barbear da mesma forma que este efeito de desidratação ajuda a conservar as múmias egípcias. Karl Drbal afirma ter feito nada menos de 200 barbas com apenas uma lâmina, a qual era afiada diariamente por meio de uma pequena pirâmide. O sueco Carl Benedicts em artigo de 1952 “Aenderung der Festigkeit von Metallen und Nichtmetallen durch eine benetzende Flussigkeit”  confirmou este efeito que denominou o chamado Flussigkeitseffekt o “efeito do mordente líquido”, que produz sobre o aço uma ação não corrosiva, porém redutora da dureza do aço. Born e Lertes em artigo de 1950 confirmou em Der Born-Lertessche Drehfeldeffekt in Dipolflussigkeiten im Gebiet der Zentimeterwellen” que as microondas do comprimento do centímetro e suas harmônicas podem produzir uma rotação acelerada das moléculas bipolares da água, deste efeito podendo resultar o processo de desidratação. Segundo Karl Drbal com o auxílio da cavidade ressonante piramidal, ou pelo efeito de concentração de uma trompa piramidal, a energia proveniente do sol pode ser suficiente. No número 9 da edição de 1973 da revista Esotera (BRD), nas páginas 799-800, Hans Joachim Hohn confirma o funcionamento da pirâmide de Queops sobre as lâminas de barbear. [2] A invenção de Karl Drbal tornou-se conhecida no Ocidente após a publicação de Psychic discoveries behind the Iron Curtain de Sheila Ostrander em 1970. [3]



[1] DEARY, Terry. Espatosos egípcios, São Paulo:Melhoramentos, 2004, p. 34
[2] TOTH, Max; NIELSEN, Greg. A força das pirâmides, São Paulo:Record, 1976, p.124
[3] https://archive.org/details/psychicdiscoveri00shei

sexta-feira, 27 de abril de 2018

Novidade no regime de dosagem ?


T239/16 OJ 2018 trata de uma patente EP1591122 tem como objeto o ácido zoledrônico para uso no tratamento da osteoporose, o ácido sendo administrado anualmente. Um documento do estado da técnica D55 trata de um estudo clínico enviado para cinco pacientes em que em um dos protocolos descritos consta uma injeção por ano de ácido zoledrônico. A questão discutida pela Câmara de Recursos é saber se estes pacientes podem ser considerados como membros do público. Como nenhum termo de confidencialidade foi escrito, discutiu-se a possibilidade de haver um acordo de sigilo implícito. Em seu depoimento o professor que conduziu os testes informa que orientou os pacientes a discutirem abertamente seu tratamento com qualquer pessoa incluindo parentes próximos e seu médico assistente. Portanto não parece existir quaisquer circunstâncias especiais para levar a acreditar que existisse um acordo de confidencialidade implícito. O fato de que em outras decisões T1081/01 e T0157/09 tal acordo poderia ser inferida é irrelevante para o presente caso. Segundo jurisprudência constante é suficiente que um único membro do público não tenha mantido segredo para que esta informação passe a fazer parte do estado da técnica. O documento D55 contudo apesar de público não serve para fins de exame de novidade porque não ensina que a osteoporose é efetivamente tratada. No entanto a Câmara de Recursos conclui que embora novo o pedido de patente não tem atividade inventiva diante de D55 pois as informações nele constantes conduziriam ao técnico no assunto, com razoável expectativa de sucesso para o tratamento da osteoporose utilizando uma administração anual de ácido zoledrônico. Esta mesma patente foi objeto de litígio na França, Holanda, Portugal, Estados Unidos, Inglaterra e Austrália. No Brasil a patente foi depositada como PI0111806 tendo sido indeferida com decisão mantida na fase recursal. Um documento D1 foi apresentado com uso do mesmo ácido zoledrônico porém com nova forma de dosagem e/ou administração. Segundo o INPI “as características de regime de dosagem e/ou administração são inconsistentes com a matéria pleiteada. Tais características, claramente definem um método de tratamento cuja proteção é vedada pelo Art. 10(VIII) da LPI, não sendo consideradas características de uso para preparação de um medicamento que é a matéria efetivamente pleiteada”. A novidade de reivindicações do tipo “uso médico” (fórmula suíça) é determinada em função da diferença entre estes dois estados patológicos e a atividade inventiva é aferida com base nos mecanismos fisiopatológico e de ação do fármaco envolvidos. Portanto, a forma de administração e o regime de dosagem não conferem novidade ou atividade inventiva ao uso pleiteado. 

http://europeanpatentcaselaw.blogspot.com.br/2018/04/t23916-caractere-public-detudes.html

segunda-feira, 23 de abril de 2018

Suficiência descritiva com uma marca ?


Em T2020/13 OJ 2018 a EPO analisou um exame em que o produto do estado da técnica era designado por uma marca comercial, um catalisador compreendendo uma mistura de marca JEFFCAT ZR-50B e JEFFCAT ZF-10. O oponente alegou que esta informação técnica não estava acessível ao técnico no assunto de modo que o documento do estado técnica, o pedido de patente D1, não teria descrição considerada suficiente. A Câmara de Recursos observou que o técnico no assunto teria contactado o serviço de atendimento ao cliente SAC da sociedade titular da marca JEFFCAT para inquerir sobre a natureza de tais produtos pois os documentos mostram que tal natureza não foi mantida em segredo. Um dos documentos do estado da técnica indica o número CAS dos componentes possibilitando desta forma se encontrar os nomes químicos na base de dados Chemical Abstracts que faz parte do conhecimento geral comum do técnico no assunto. O fato de que houve uma mudança de marca antes da publicação de D1 não é relevante porque um documento do estado da técnica deve ser lido em contexto levando em conta todos os fatores pertinentes para compreender seu ensinamento técnico. No caso particular em que se sabe que um termo foi abandonado entre o depósito do pedido em exame e sua publicação, esta circunstância deve ser levada em conta pelo técnico no assunto que deve sempre se colocar como estando na data de depósito de D1 e não de sua publicação. [1]


[1] http://europeanpatentcaselaw.blogspot.com.br/2018/04/t202013-produits-de-lart-anterieur.html

terça-feira, 17 de abril de 2018

Closest Prior Art como documento não técnico ?


Em T2101/12 OJ 2018 a invenção descreve um método para fornecer assinaturas eletrônicas a documentos. A Câmara de Recursos não usa D2 como estado da técnica mais próximo por estar mal redigido o documento. A Câmara preferiu usar como estado da técnica mais próximo o conhecimento geral comum (CGK) do técnico no assunto, mais particularmente a situação em que um documento é assinado manualmente pelo notário de um cartório e procede sua autenticação. O depositante contestou que segundo T172/03 uma informação pública que não incida em um campo tecnológico ou um campo no qual o técnico no assunto seria esperado extrair informações técnicas relevantes não pode ser considerado uma informação que pertença ao estado da técnica e, portanto, não poderia ser usado como closest prior art. Segundo o depositante a Câmara de Recursos teria de partir de um sistema de computadores em rede para então julgar se isso seria mera automação de limitações impostas por aspectos comerciais. A Câmara de Recursos discordou desta abordagem quando a guia de exame VII-2 expressamente prevê que tudo que é acessível ao público faz parte do estado da técnica. Não existe esta limitação de se ater apenas aos processos técnicos. Se o legislador quisesse impor esta limitação não teria usado a palavra “tudo” no artigo 54-2 da EPC “The state of the art shall be held to comprise everything made available to the public by means of a written or oral description, by use, or in any other way, before the date of filing of the European patent application”. Não há qualquer razão para que o técnico no assunto ignore uma informação que é de conhecimento geral e útil simplesmente porque ela não seja considerada técnica. A atividade humana do notário do cartório mencionada é bem conhecida e a Câmara de Recursos não enxerga o por que um técnico no assunto no campo da automação não levaria esta informação em consideração. O desejo em automatizar atividade humanas é uma constante e é obvio que em algum momento o técnico no assunto partiria para automatizar tal atividade. Portanto é obvio em substituir o notário por um servidor de terceiros para prover uma rede eletrônica que conecte os assinantes com este servidor de modo que ao final, por meio de uma simples automação de um método conhecido conclui-se que a invenção reivindicada é óbvia. A Câmara, portanto, adota como abordagem ter como ponto de partida de sua análise um processo não técnico, enquanto que na decisão COMVIK parte-se de um problema técnico levando-se em conta limitações impostas por aspectos não técnicos.[1]


[1] http://europeanpatentcaselaw.blogspot.com.br/2018/04/t210112-contre-t17203-et-g-vii-2.html

sexta-feira, 13 de abril de 2018

Novidade: a regra do documento único


Em In Microsoft Corp. v. Biscott (Fed. Cir. 2017) o Federal Circuit que a regra de antecipação da novidade de uma reivindicação exige que 1) um documento do estado da técnica que revele todos os elementos da reivindicação dispostos tal como descrito na reivindicação, 2) se o documento do estado da técnica não descreve expressamente todas as limitações tal como disposto da reivindicação, ainda assim poderá haver antecipação se o técnico no assunto, puder vislumbrar a invenção reivindicada ou a combinação dos elementos em questão. A invenção reivindicada em exame trata de meios de gravação tendo um conjunto de quatro tipos de instruções executáveis por um processador. O documento do estado da técnica se refere a um subconjunto de instruções executadas pelo processador, mas não se refere aos tipos especificados na reivindicação de modo que a antecipação não ficou provada. [1]


[1] COCHRAN, David. Anticipation Requires More Than A Reference That Discloses All The Elements, 12/01/2018 http://www.ptablitigationblog.com/anticipation-requires-reference-discloses-elements/

quarta-feira, 11 de abril de 2018

Patentes e Santos Dumont


Santos Dumont manifestou por diversas vezes que não tinha intenções de pedir patentes de suas invenções. Thomas Edison em encontro com Santos Dumont nos Estados Unidos em 1902 justificou seu desinteresse por invenções em aeronáutica: “Não farei nenhum empreendimento que não possa ser protegido dos piratas que vivem do trabalho dos inventores, e não acredito que se possa patentear uma máquina voadora nem um aeroplano, ou qualquer um de seus componentes. Caso alguém consiga construir uma máquina voadora bem-sucedida comercialmente, dúzias de pessoas iriam de imediato copiá-lo e tirar proveito do trabalho original do inventor. Nenhum juiz neste país reconheceria este aparelho como uma verdadeira invenção, porque já foi tanto feito e escrito sobre o assunto que a única diferença entre uma máquina bem-sucedida e os inúmeros fracassos ocorridos será muito tênue. Duvido que se descubra um novo princípio ao qual possa ser feita uma reivindicação de patente”. Em resposta Santos Dumont não contestou os argumentos de Edison: “Infelizmente o que ele diz sobre o reconhecimento do trabalho do inventor é verdadeiro, porém jamais me importei com isso”[1].
Mesmo não protegendo suas invenções por patentes Santos Dumont tomou precauções para não perder o reconhecimento de suas invenções, concorrendo a diversos prêmios públicos onde a autoria de suas invenções pudesse ser publicamente reconhecida e reportada pela imprensa local de Paris. Ao iniciar suas pesquisas com aparelhos mais pesados que o ar, uma área onde a competição era muito grande, teve o cuidado de manter suas pesquisas em segredo até o momento de suas apresentações em público. Segundo Paul Hofman este segredo é facilmente explicado: “Não tinha interesse em patentear sua nova máquina ou tirar proveito dela de outra maneira, mas como era um novato nos vôos dos mais pesados que o ar, a única maneira de sobrepor-se àqueles que tinham trabalhado anos para solucionar o problema era pegá-los de surpresa. Quando realizou seu trabalho pioneiro com os balões a motor, ele estava muito mais evoluído que os demais aeronautas, e a chance de alguém circunavegar a torre Eiffel antes dele era mínima; assim ele podia revelar seus projetos. Mas agora, com a competição crescente, sabia que era improvável que fosse o primeiro a voar num aparelho mais pesado que o ar e, se não fosse bem-sucedido, não gostaria que soubessem que não tivera êxito em sua tentativa”[2].
O não reconhecimento de patentes impediu que Santos Dumont auferisse rendimentos de suas invenções. O Demoiselle foi vendido por toda a Europa, sob sua autorização, pelo fabricante de automóveis Clement Bayard [3]. O motor também foi produzido por outros dois fabricantes de automóveis a Dutheil & Chalmers e a Darracq. Os dirigentes da Darracq pensaram logo em patentear o referido motor, visando a futuros lucros comerciais, porém Santos Dumont, processou a empresa pois sua proposta era o de permitir a máxima difusão do projeto popularizando o uso do avião tal qual Henry Ford fizera com o automóvel ao produzir o modelo T a baixo custo, muito embora Henry Ford tenha recebido diversas patentes como a US747909 de 1903. Em 1916 foram vendidos 730 mil automóveis modelo T ao custo de $360  unidade, ao passo que em 1924 a produção chegou a 2 mihções de auom[oveis ao custo de $290 a unidade[4]. Ao final do litígio Santos Dumont conseguiu impedir a concessão de patente para o motor Darracq utilizado no Demoiselle [5]. Uma companhia de Chicago vendeu o modelo nos Estados Unidos. O projeto do aparelho foi divulgado na Revista Popular Mechanics de junho e julho de 1911, e com isso o aeroplano foi reproduzido em diversos locais. A revista “A Ilustração” de 12 de fevereiro de 1910, mostrava um anúncio de fabricantes de aviões. “Um ‘Blériot nº 11’ custava 12.000 francos; um ‘Antoinette’, 25.000 francos; um biplano ‘Voisin’, sem motor, 12.000 francos; um ‘Farman’, 13.000 francos. Os motores tinham mais ou menos preço idêntico. O ‘Demoiselle” era o mais barato. Um, sem motor, 2.000 francos; com motor de 30 cavalos, 9.000 francos; com motor leve, 5.000 francos” [6].


[1] HOFFMAN, Paul. Asas da Loucura: a extraordinária vida de Santos Dumont, Rio de Janeiro: Objetiva, 2010, p. 208
[2] HOFFMAN.op. cit. p. 277
[3] HOFFMAN.op. cit. p. 299
[4] McCLELLAN III, James; DORN, Harold. Science and technology on world history: an introduction. The Johns Hopkins University Press, 1999, p.338
[5] COSTA, Fernando Hippólito da. Alberto Santos Dumont: o pai da aviação. Rio de Janeiro: Adler, Brasília: Banco do Brasil, 2006, p. 62
[6] MAIER, Félix. Santos Dumont: 100 Anos Do 14-bis set. 2007 http: //www.webartigos.com/articles/663/4/Santos-Dumont-100-Anos-Do-14-bis/pagina4.html.


segunda-feira, 9 de abril de 2018

Suficiência da anterioridade: o caso Rigidex


Na EPO a Câmara de Recursos em T1833/14 OJ 2018 considerou que o produto Rigidex comercializado antes do depósito do pedido de patente em exame de fato privou a novidade da composição de polipropileno reivindicada. A Câmara observa que segundo G1/92 a composição química de um produto faz parte do estado da técnica na medida em que este produto esteja acessível ao público e que possa ser analisado e reproduzido pelo técnico no assunto independentemente da questão de se saber se seria possível detectar as razões particulares para se analisar esta composição: “todo ensinamento técnico tem essencialmente por objetivo permitir ao técnico no assunto de fabricar ou utilizar um determinado produto aplicando este ensinamento. No caso de um produto colocado no mercado o técnico no assunto deve contar com seus conhecimentos técnicos gerais para reunir todas as informações que lhe permitam preparar este produto. Se o técnico no assunto puder descobrir a composição ou estrutura interna do produto e reproduzi-lo sem uma dificuldade excessiva então, sua composição ou estrutura interna fazem parte do estado da técnica”. No caso em questão, sabe-se que no campo dos polímeros, as condições de preparação têm uma influência significativa nas propriedades do produto obtido. Neste campo, onde é comum caracterizar os produtos por meio de parâmetros, os requisitos de adequação da descrição são analisados ​​com grande atenção, e são considerados satisfeitos apenas se a patente divulgar o método de preparação. O mesmo critério deve aplicar-se aos produtos colocados no mercado. A Câmara de Recursos conclui que a mera disponibilidade do Rigidex no mercado era insuficiente para que o técnico no assunto pudesse fabricá-lo como consequência uma amostra deste produto no mercado não constitui estado da técnica segundo o artigo 54(2) da EPC.[1]


[1] http://europeanpatentcaselaw.blogspot.com.br/2018/04/t183314-lusage-anterieur-doit-etre.html

terça-feira, 3 de abril de 2018

Rato transgênico da Regeneron

A patente da Regeneron EP1360287 trata de método de produção de rato transgênico possuindo genes de anticorpos humanos. O pedido divisional EP 2264163 refere-se ao rato propriamente dito. O rato transgênico Veloclmmune produz anticorpos tendo uma região variável humana e uma região constante do rato que responde de forma natural a uma ameaça antigênica e assim espelha a reação imune normal. Isto facilita a produção de um espectro diverso de anticorpos contra o mesmo alvo dentro de um simples rato. As patentes da Regeneron tratam de um método para modificação genética de regiões variáveis de anticorpos de uma célula de rato pela sua substituição de genes variáveis de anticorpos de rato com os equivalentes genes humanos. Em 2007 a Regeneron fez um acordo de licenciamento não exclusivo com AstraZeneca para uso da tecnologia. Na Inglaterra a Regeneron acionou judicialmente a Kymab e a Novo por contrafação, que em sua defesa alegaram que a patente não tinha suficiência descritiva e não tinha novidade e atividade inventiva. O Tribunal rejeitou as alegações de falta de novidade e atividade inventiva mas concordou com a insuficiência descritiva. O método reivindica a substituição in situ dos segmentos de gene V, D e J de um local endógeno com os segmentos de genes humanos ortólogos V, D e J. O juiz considerou que se tratava do apagamento de sequências de genes do rato de pelo menos um segmento V e todos os segmentos D e J (>100kb) e a inserção de regiões humanas equivalente (>75kb). A inserção e apagamento de grandes pedaços de DNA não era possível na época da invenção e desta forma, o juiz concluiu que o método e o rato são descritos de forma insuficientes. No recurso a Regeneron não questionou que de fato na época da invenção o técnico no assunto não teria sido capaz de apagar 100kb e inserir 75kb de DNA, Ao invés disso, alegou que o técnico no assunto teria feito ajustes no método de modo a reduzir o tamanho das inserções para um valor manipulável e removendo regiões intergênicas consideradas desnecessárias, o "minigene". A Kymab alegou eque este argumento do dito minigene não foi colocado previamente e que agora seria tarde para argumentar com base neste argumento novo. A Corte de Recursos concordou com a Regeneron uma vez que as reivindicações não especificam que seria necessário inserir o locus humano completo ou apagar o locus do rato completo, e que deste forma minigenes poderiam ter sido usados para implementar a invenção, A Corte de Recursos considerou que o argumento do minigene contendo apenas 20kb de comprimento apenas contendo um subconjunto de segmentos de gene faz parte do conhecimento geral comum na data de prioridade e que o técnico no assunto teria considerado isso em esforço indevido para implementar a invenção. A Corte de Recursos observou que o técnico no assunto para implementar a invenção não está preso ao que o pedido de patente descreve, mas que pode usar o conhecimento gera comum para fazer modificações consideradas óbvias, no caso seria óbvia encurtar os segmentos de genes: "a patente não deixa de ser suficiente simplesmente porque o relatório descritivo da patente promete muito". No Brasil a PI0115096 foi concedida em 2016 para método para modificar geneticamente um gene endógeno ou local cromossômico em células eucarióticas não humanas e em células tronco embriônicas de camundongos. [1]

[1] http://ipkitten.blogspot.com.br/2018/03/regeneron-v-kymab-part-i-sufficiency.html

Indicadores de qualidade em patentes


Um índice para se aferir qualidade de uma patente pelo escritório de patente será a capacidade desta patente ser confirmada caso surja uma demanda judicial. Da mesma forma a capacidade de um pedido indeferido pelo INPI ter sua decisão de indeferimento mantida caso arguida a decisão na Justiça. No entanto, percentualmente poucos são os casos com questionamentos na justiça, e portanto na prática estes índices tornam-se pouco relevantes para se aferir a qualidade do exame de patentes.

Na esfera administrativa o número elevado de reversões de decisão em recursos contra o indeferimento ou de número excessivo de deferimentos em primeiro exame podem ser indicadores de baixa qualidade no exame, contudo tais índices não podem ser tomados como conclusivos, cabendo a análise caso a caso. A quantidade de documentação não patentária usada nos relatórios de busca bem como o número de documentos citados como fundamentação para uma ciência de parecer são outros parâmetros que podem ser utilizados para o controle de qualidade, no entanto, novamente não de uma forma conclusiva.

Nos casos de indeferimento, uma vez que o backlog de exame do INPI esteja elevado, muitas vezes o requerente desiste da intenção de entrar com recurso não propriamente por concordar com a decisão, mas porque uma vez decorrido tantos anos (em alguns casos oito a dez anos do depósito à decisão do pedido) o requerente perde o interesse comercial no pedido de patente. A falta de assessoria jurídica adequada, por outro lado, pode levar ao requerente a desistir de seu pedido prematuramente diante de um primeiro parecer do INPI negativo à patenteabilidade do pedido.

Dados de 2004 e 2006 mostram que no INPI enquanto o número de patentes concedidas aumentou de 2481 para 2785, o número de nulidades administrativas reduziu de 86 para 52, o que é um parâmetro de que a qualidade das patentes concedidas aumentou no mesmo período [1]. Na EPO o número de depósitos de patente aumentou de 135 mil para 140 mil no período de 2006/2007 (aumento de 4%), no entanto, o número de patentes concedidas no mesmo período decresceu de 62.8 mil para 54.7 mil, uma queda de cerca de 13%, o que mostra um maior rigor na concessão de patentes pela EPO. Apesar disso, em setembro de 2008 cerca de 250 funcionários da EPO entraram em greve se queixando da pressão por maior número de concessões e consequentemente deterioração da qualidade do exame de patentes [2]. Com a crise de 2009 o número de depósitos reduziu para 134 mil em comparação com 147 mil de 2008 (queda de 8%). O número de patentes concedidas reduziu de 59 mil em 2008 para 52 mil em 2009, uma queda de 13%, ou seja, uma queda mais acentuada que a observada no número de depósitos, o que mostra maior rigor no exame [3]. Em 2011 foram 243 mil depósitos um aumento de 2,6 % em relação a 2010 que teve 237,5 mil depósitos, ao passo que 62 mil patentes concedidas em 2011 para 58 mil concedidas em 2010, um aumento de 7% no número de patentes concedias. Ou seja, no período 2010 a 2011 o ritmo de concessões foi maior que o de depósitos. [4]

Em palestra ministrada em abril de 2012 na Firjan no Rio de Janeiro o presidente da EPO Benoît Battistelli questionado sobre quais as razões para as empresas aumentarem o volume de depósitos na EPO mesmo diante da crise econômica que atinge a Europa apresentou como razões que o aumento do número de depósitos é uma amostra da confiança das empresas nas patentes como proteção de seus ativos intelectuais e da qualidade das patentes concedidas. Em segundo lugar a taxa de concessão (grant rate) da EPO entendida como a razão entre o número de deferimentos e a soma de arquivamentos e indeferimentos tem se mantido em torno de 40% o que mostra o rigor nas concessões. [5] Em terceiro lugar Battistelli aponta que a primeira ação da EPO ocorre em média em 20 meses após o depósito e este tempo é considerado razoável para a maior parte das empresas. Mecanismos de exame acelerado são possíveis. Muitas empresas, contudo, utilizam o sistema de patentes de forma defensiva, não estão com a patente envolvida em litígios ou estão mais interessadas na avaliação técnica da primeira ação, podendo, portanto, aguardar mais tempo para decisão final. Outras ações do escritório de patentes como a utilização de ferramentas automáticas de tradução, utilização de um sistema de classificação uniforme com Japão e Estados Unidos, aumento do número de examinadores tem contribuído para aumento da qualidade do exame.

Uma pesquisa divulgada pela Revista Intellectual Asset Management em 2010 mostra que cerca de 71% dos entrevistados apontam como muito boa a qualidade de exame na EPO, seguida de Japão (55%), Estados Unidos (52%), Coreia (29%) e China (22%). Uma das razões para baixa qualidade do exame de Coreia e China é atribuída a má qualidade das traduções. Cerca de 17% dos entrevistados apontam uma deterioração da qualidade do exame no USPTO nos últimos anos, maior índice entre os cinco escritórios pesquisados, que compõe o chamado IP5. A mesma pesquisa realizada pela mesma revista e divulgada em julho de 2011 mostra pouca variação dos dados EPO (74%), JPO (57%), USPTO (50%), KIPO (34%), SIPO (23%).[6] Apesar dos baixos índices obtidos pelo KIPO, entervistas realizads por Peter Drahos mostra que na área tecnológica de software e telecomunicações empresas como Microsoft, Intel e 3M tem preferência em escolher o KIPO como autoridade de busca e exame PCT pela qualidade do exame em combinação com as taxas mais atrativas.[7]

Nos Estados Unidos críticos apontam que o sistema de pontuação da produção dos examinadores ao conferir o mesmo peso para deferimentos ou indeferimentos tem uma tendência em estimular os deferimentos que exigem menos tempo de exame e menos etapas de exame.[8] As Autoridades de Busca e Exame do PCT mantém informes regulares sobre as medidas tomadas em cada escritório para monitorar e aumentar a qualidade do exame de suas buscas e exames. [9]

No Brasil uma pesquisa realizada pelo IBOPE em 2009 e divulgada pela Câmara Americana de Comércio (Amcham Brasil) mostra que 55% dos entrevistados são de opinião que o INPI não atende de maneira satisfatória as funções para as quais foi criado com relação ao setor de patentes, o pior desempenho dentre os campos de atuação desta instituição. A pesquisa Amcham/Ibope indica que a concessão de patentes ainda é demorada no País com média de 7,8 anos.

Na pesquisa de 2010 a pesquisa mostrou que, os critérios de análise entre um técnico e outro variaram mais do que no ano anterior, uma situação que acontece frequentemente ou sempre para 72% dos usuários, contra 61% registrados em 2009. Houve retrocesso também quanto à clareza e à objetividade dos critérios e parâmetros de decisão. Enquanto, em 2009, 64% consideravam as tomadas de decisão frequentemente ou sempre precisas, em 2010, esse índice passou para 57%.[10]

No ano de 2011, a pesquisa continuou a revelar que a percepção de que os critérios de exame entre um examinador e outro variam muito, apesar de ter ocorrido uma queda em termos numéricos. Somando-se os critérios “sempre” e “frequentemente”, o índice, que contava com 72% das respostas em 2010, caiu para 57%, devendo-se considerar, no entanto, que o número de respostas NS/NR subiu de 10% para 25%. Conclui-se, portanto, que não houve melhoras significativas. Outro resultado em que a insatisfação dos usuários se manteve presente, é “Com que frequência a coerência das exigências variam de técnico para técnico?” Nesse critério também houve melhora, pois as respostas “sempre”, caíram de 13% para 11%, e as respostas “frequentemente” diminuíram de 57% para 41%.

Da mesma maneira que no critério anterior, deve-se considerar que o número de respostas NS/NR subiu de 12% para 27%, de modo que, no cômputo geral, pode-se concluir que não houve melhoras significativas. Quanto aos critérios e parâmetros das decisões serem claros e objetivos o índice apontando como resposta “sempre” e “frequentemente” tem caído de 2009, 2010 e 2011 para respectivamente 64%, 57% e 51%.[11]

Em maio de 2010 Bruno van Pottelsberghe de la Potterie publicou um estudo sobre qualidade no exame de patentes entre os escritórios USPTO, JPO e EPO [12]. O objetivo do estudo foi o de desenvolver uma metodologia para avaliar a qualidade dos sistemas de patentes. O grande aumento no número de depósitos tem agravado o problema de backlog no exame de patentes dos escritórios. Este backlog é tido como uma barreira não tarifária às empresas estrangeiras dentro do país, além de constituir um aumento no período de incerteza jurídica da validade das patentes solicitadas.

O estudo argumenta que o índice de deferimentos é fortemente tendencioso e não é um bom indicador da qualidade de exame. Isto se deve a quatro fatores: a métrica usada (a EPO divulga taxas de deferimentos dentre as decisões realizadas o que inclui retiradas, indeferimentos e concessões o que dificulta a comparação com dados de outros escritórios que divulgam o número de deferimentos entre os depósitos), o excesso de depósitos fracos realizados (muitos depositantes solicitam para uma mesma invenção 10 pedidos, com boas chances de ter ao menos 1 deferido. Para estatística do escritório isto significaria uma taxa de concessão de 10%, mas para o requerente 100%), pedidos divididos, e grande variação no tempo de exame entre diferentes áreas tecnológicas.

Independente da métrica usada os dados mostram que a taxa de concessão da EPO tem se mantido estável em 65% ainda que se tenha observado um grande aumento nos depósitos no mesmo período o que sugere, que a qualidade de exame tenha baixado, uma vez que uma parte significativa deste aumento de depósitos é atribuído a pedidos de baixa qualidade. Nicolas van Zeebroeck nota que esta taxa varia conforme o setor tecnológico (69% para indústria química, 54% para biotecnologia, 50% para telecomunicações, 67% para eletrônica, 72 para veículos, 69% para engenharia civil e 66% para necessidades humanas) e detecta um leve declíneo na taxa de concessão entre 1980 e 1995 e conclui que qualidade das patentes solicitadas, e não propriamente o exame declinou. [13]Por outro lado, estatísticas de litígios também são fortemente tendenciosas uma vez que a grande maioria das patentes não é submetida a litígio e ainda assim quando há litígio, muitas das vezes a questão é resolvida em acordos privados para se evitar os altos custos envolvidos.

Com uma proposta alternativa de avaliação de qualidade do exame o autor define qualidade como a capacidade em que os sistemas de patente atendem as condições de patenteabilidade de uma forma transparente. Desta forma são avaliados tanto os aspectos legais que descrevem as condições de patenteabilidade (matéria patenteável, novidade, atividade inventiva, taxas) como os aspectos operacionais que colocam em prática tais padrões.

Quanto aos relatórios de busca, Japão e Estados Unidos, em menor grau, tem terceirizado parte dos relatórios de busca com empresas privadas. No caso japonês estes escritórios privados são em grande parte formados por ex-examinadores de patentes. Cingapura terceiriza o exame com os escritórios de Austrália Áustria e Dinamarca. A Dinamarca, por sua vez também realiza exames para o escritório inglês de patentes, Islândia e Turquia. A Holanda realiza exames para a Inglaterra. O USPTO realiza parte das buscas de exame ISA/IPEA em escritórios como os da Austrália. A Coreia terceiriza parte das buscas de patentes para o Korean Intellectual Property Institute (KIPI) e outras entidades privadas.[14] O estudo conclui que o relatório de busca da EPO possui melhor qualidade porque realizado pelo próprio escritório. Ademais apenas EPO disponibiliza publicamente seus relatórios de busca conferindo maior transparência. Nos anos 1990 a EPO adotou o plano BEST (Bringing Examiners and Searches Together) em que o mesmo examinador realiza a busca e o exame do pedido. Até então os examinadores lotados em Haia realizavam a busca enquanto os examinadores em Munique realizavam o exame. A medida foi tomada tendo por objetivo aumentar a qualidade do exame.[15]

O conhecimento de três idiomas dos examinadores da EPO amplia as capacidades de buscas destes examinadores. Quanto aos examinadores a rotatividade na EPO e JPO em torno de 5% é bem inferior a observada no USPTO onde o mesmo índice atinge 33%, o que significa examinadores mais bem treinados na EPO e JPO do que no USPTO. A sobrecarga de trabalho dos examinadores no USPTO é muito superior a observada na EPO e JPO, enquanto no USPTO cada examinador examina 1700 reivindicações por ano, este número é de 1400 no JPO e 540 na EPO.

Um procedimento de oposição administrativa num período de 9 meses após a concessão da patente é outro fator que contribui para qualidade do exame da EPO, diante do USPTO e JPO onde não existe esta etapa administrativa após a concessão. A presença de um período de graça nos Estados Unidos e Japão contribui para atrasar a data em que a tecnologia entra no domínio público. Com relação as modificações no conteúdo das reivindicações, enquanto a EPO é mais flexível, por outro lado o USPTO possibilita o depósito de continuations in part e pedidos divisionais onde estas flexibilizações são permitidas. No Japão é possível aumentar o quadro reivindicatório até o primeiro exame, o que pode significar mais de três anos após o depósito do pedido. Com as novas regras de pedidos divisionais na EPO publicadas em abril de 2010 o uso deste mecanismo na EPO é muito mais limitado que no USPTO. No USPTO ainda é possível para os pedidos domésticos que visam apenas ao mercado norte americano manter o pedido não publicado até a decisão final de concessão, o que possibilita a existência de patentes submarino. Na EPO e Japão os pedidos são todos publicados após 18 meses do depósito salvo a retirada pelo depositante. Tomando-se todos estes aspectos em conjunto Bruno Potterie avalia que a EPO possui uma avaliação mais rigorosa do conceito de novidade bem como maior transparência no exame.

Um pedido depositado no USPTO é automaticamente submetido a busca e exame, ao passo que na EPO e JPO o depositante deve solicitar o pedido de exame. A EPO publica o relatório de busca em cerca de 18 meses após o depósito, o que fornece ao depositante indicativo da viabilidade do pedido. Com isto cerca de 20% a 30% dos pedidos são retirados após a publicação do relatório de busca. No Japão o pedido de exame pode ser feito em até três anos após o depósito. Antes de outubro de 2001 este período era de sete anos.[16] Estudos mostram que a redução do tempo para pedido de exame leva a um aumento significativo dos pedidos a serem examinados associado com uma queda de qualidade. A existência de uma etapa processual de pedido de exame contribui portanto para redução do backlog. Este período é mais curto na EPO, porém a publicação prévia do relatório de busca junto com uma opinião escrita não vinculante tem como efeito aumentar o número de desistências. O USPTO privilegia a velocidade de exame com o custo de ter de analisar um número maior de pedidos e consequentemente comprometendo a qualidade de exame.[17]

Dados de 2008 mostram que o tempo de pendência no USPTO é de 32 meses ao passo que no Japão é de 36 meses do pedido de exame somado a 32 meses de pendência, totalizando 68 meses, enquanto na EPO este tempo é de 18 meses de pedido de exame somados a 45 meses, o seja, algo em torno de 63 meses. Enquanto na EPO o exame exige cerca de 30 horas na EPO, no USPTO este tempo é de 13 horas, ainda que este valor varie conforme a área tecnológica[18]. Considerando o tempo de primeira ação (first action) do USPTO e o tempo gasto na decisão (disposal) a média é de 20.5 horas, o que significa que em média para examinador deve realizar 75 primeiras ações por ano, e 75 decisões, ao passo que para um examinador principal (primary examiner) de maior experiência estes índices são de aproximadamente 100 primeiras ações e 100 decisões por ano.[19]

O tempo de busca na EPO é estimado em 8 horas e no USPTO 2 horas, nos dois casos o tempo de busca é estimado em média em 20% do tempo de exame. Na EPO o tempo de exame é maior por razões estruturais: 1) o examinador dispende mais tempo por exame, 2) o exame é validado por três examinadores, 3) o pedido na EPO sofre adaptações em função do exame do pedido equivalente no USPTO o que modifica a matéria em exame e portanto gerando mais etapas, 4) No caso de um parecer desfavorável o depositante pode solicitar oral proceeding, ao passo que no USPTO e JPO este pedido já poderia ser indeferido caso a resposta do requerente ao primeiro exame não fosse satisfatória, 5) os depositantes dispõem de instrumentos burocráticos para atrasar a concessão da patente.

O estudo conclui, ao ponderar cada um destes fatores que o exame na EPO possui qualidade 250% superior a observada no USPTO enquanto o JPO em posição intermediária possui qualidade 170% superior a observada no USPTO. O estudo estima que cerca de 2 milhões de patentes estejam em vigor nos Estados Unidos (46 milhões de reivindicações), enquanto 0,5 milhão na Europa (8 milhões de reivindicações) e 1.3 milhões no Japão (12 milhões de reivindicações). Ou seja, quanto menor a qualidade do exame , maior o número de patentes em vigor, de legitimidade questionável. O autor questiona a viabilidade de projetos de compartilhamento de trabalho de exame como os PPHs antes que se harmonize diversos fatores estruturais no exame.

Dietmar Harhoff e Stefan Wagner[20] analisam o tempo de exame na EPO e mostram que o tempo gasto no exame de uma patente é função da capacidade de exame do escritório de patentes, da complexidade do pedido e de medidas que conduzem a um exame mais acelarado ou mais demorado por questões estratégicas. Patentes muito citadas nos relatórios de busca de pedidos posteriores são aprovadas mais rapidamente (tempo de exame menor) que as patentes menos importantes (com menor índice de citação), o que se explica pelo fato de serem tecnologias em geral de maiores níveis de inventividade e portanto de mais fácil identificação da novidade e atividade inventiva. Este resultado está compatível com estudo similar realizado por Regibeau & Rockett[21] com pedidos analisados pelo USPTO. Um melhor exame na fase administrativa mostra-se socialmente mais vantajoso do que transferir essa tarefa para fase judicial, ademais um maior tempo de exame favorece a disponibilidade de novas informações para subsidiar o exame. Considerando o tempo de treinamento de um examinador em torno de três anos, o escritório europeu de patentes EPO dispõe de um tempo de resposta lento para adequar a demanda de pedidos a serem examinados com a quantidade necessária de examinadores. Considerando pedidos depositados entre 1978 e 1995 o estudo de 2006 mostra que entre os pedidos analisados 63.5% foram concedidos, 5,1% indeferidos, 27,4 % abandonados e 3.9% ainda pendentes. Os índices de concessão mostram-se bastante homogêneos (70.8% em engenharia nuclear e 55.1% em biotecnologia). A complexidade dos pedidos, medida em número de reivindicações aumentou de uma média de 9.84 reivnidcações em 1978 para 15.36 reivnidcações em 1998.


[1] INPI. Qualidade das decisões de patentes vem aumentando. http: //www.inpi.gov.br/noticias/qualidade-das-decisoes-de-patentes-vem-aumentando.
[2]  EPO staff strike over patent quality. OUT-LAW News, 24/09/2008 http: //www.out-law.com/page-9453.
[3]  Annual Report 2009 http: //www.epo.org/service-support/publications/general-information/annual-reports/2009.html.
[4] http://www.epo.org/news-issues/press/releases/archive/2012/20120117.html
[5] http://www.trilateral.net/statistics/tsr/fosr2010/fullreport.pdf
[6] http://www.epo.org/news-issues/news/2011/20110628.html http://documents.epo.org/projects/babylon/eponet.nsf/0/15D2798FB51DB1E4C12578BD003FE172/$File/IAM_extract_en.pdf
[7] DRAHOS, Peter. The global governance of knowledge: patent offices and their clients. Cambrige University Press:United Kingdom, 2010, p.194, 237
[8] MERGES, Robert. As Many as Six Impossible Patents Before Breakfast: Property Rights For Business Concepts and Patent System Reform, 14 BERKELEY TECH. L.J. 577 (1999). LEMLEY, Mark. Rational Ignorance at the Patent Office, 2000 THE BERKELEY LAW & ECONOMICS WORKING PAPERS 2, Article 5, at n.3 (2001).; KESAN, Jay. Carrots and sticks to create a better patent system,v.17 Berkeley Tech Law Jornal, 2001, p.765-766,
[9] http://www.wipo.int/pct/en/quality/authorities.html
[10] Pesquisa Amcham/Ibope: em 2010, cresce percepção positiva do empresariado sobre INPI http: //www.amcham.com.br/regionais/amcham-sao-paulo/noticias/2010/pesquisa-amcham-ibope-em-2010-cresce-percepcao-positiva-do-empresariado-sobre-inpi/?searchterm=Amcham/Ibope.
[11] Relatório do Instituto Nacional da Propriedade Industrial - INPI 2011
[12] POTTERIE, Bruno van Pottelsberghe de la. The quality factor in patent systems. Ecore Discussion Paper, 2010/42 http: //econpapers.repec.org/paper/ecawpaper/2013_2f59650.htm.
[13] ZEEBROECK, Nicolas van. The puzzle of patent value indicators. Economics of Innovation and New Technology. V. 20, N.1, jan. 2011, p.33-62
[14] DRAHOS, Peter. The global governance of knowledge: patent offices and their clients. Cambridge University Press:United Kingdom, 2010, p.20, 24, 130, 154, 238
[15] DRAHOS, Peter. The global governance of knowledge: patent offices and their clients. Cambridge University Press:United Kingdom, 2010, p.124; GRUBB, Philip, W. Patents for Chemicals, Pharmaceuticals, and Biotechnology: Fundamentals of Global Law, Practice, and Strategy; Oxford University Press, 2004, p.125
[16] DRAHOS, op.cit., p.170
[17] BESSEN, James; MEURER, Michael. Patent Failure: How Judges, Bureaucrats, and Lawyers Put Innovators at Risk. Princeton University Press, 2008, p. 1804/3766 (kindle version)
[18] DRAHOS, Peter. The global governance of knowledge: patent offices and their clients. Cambrige University Press:United Kingdom, 2010, p.76; USPTo, 2004 USPTO Should Reassess How Examiner Goals, Performance Appraisal Plans, and The Award System Stimulate and Reward Examiner Production, http://www.oig.doc.gov/OIGPublications/IPE-15722.pdf
[19] LUNDBERG, Steven; DURANT, Stephen; McCRACKIN, Ann. Electronic and software patents. The Bureau of National Affairs, 2005, p.9-3
[20] HARHOFF, Dietmar; WAGNER, Stefan. Modeling the Duration of Patent Examination at the European Patent Office, Discussion paper 2006-14, November 2006, http://epub.ub.uni-muenchen.de/1256/1/Harhoff_wagner_06.pdf
[21] R´egibeau, P. & Rockett, K. Are More Important Patents Approved more Slowly and Should They?, Department of Economics Working Paper No. 556, University of Essex, 2003