segunda-feira, 30 de março de 2015

Caracterizado por nos Estados Unidos

Alguns países requerem a estruturação das reivindicações na forma que destaca o estado da técnica da parte caracterizante da invenção, forma conhecida no USPTO como “jepson type” devido a uma decisão administrativa de 1917 do USPTO[1]. O fato desta expressão delimitar o estado da técnica pode ser usado pelas Cortes para confirmar de forma implícita que toda a parte descrita no preâmbulo é reconhecida pelo próprio inventor como não sendo nova, e por este motivo tem sido uma expressão de ligação utilizada menos preferencialmente pelos inventores.[2] Em In re Ehrreich[3] a Corte reconhece como exceção que “o preâmbulo não compreende o estado da técnicaquando o depositante comprovar que o formato Jepson utilizado foi adotado como forma de se evitar rejeição por duplo patenteamento com um pedido co-pendente e o examinador não citar nenhuma anterioridade que mostre que a matéria do preêmbulo está compreendida no estado da técnica”. Tendo em vista esta limitação Steven Lundberg recomenda que o preâmbulo seja sucinto ou que os elementos nele descritos sejam repetidos no corpo da reivindicação após a expressão de ligação.[4]
Em decisão de 2014 em Q.I.Press Controls v. Michelle Kee o Federal Circuit analisou a patente US6867423 referente a sistema de inspeção visual para identificação de erros em uma operação de uma prensa tipográfica, como os relacionados com o desalinhamento do papel ou qualidade da cor. A invenção consiste de uma câmera digital associada a um conjunto de LEDs em torno da lente. O estado da técnica mostrava câmera com LEDs localizados em torno da lente assim como sistemas com uso de câmeras para monitorar impressoras tipográficas, porém nenhuma dos documentos de anterioridade combinava estas duas características. A referência ás impressoras tipográficas ocorre no preâmbulo da primeira reivindicação de US6867423. A Corte observa que “se o preâmbulo, quando lido dentro do contexto da reivindicação como um todo, recita alguma limitação da reivindicação, ou, se o preâmbulo da reivindicação é necessário para “dar vida, sentido e vitalidade” á reivindicação, então, nestes casos, o preâmbulo da reivindicação deve ser interpretado como fazendo parte de toda a reivindicação (as if in the balance of the claim)”.[5] Para Dennys Crouch as reivindicações devem ser avaliadas por um técnico no assunto que deverá responder a questão se a característica presente no preâmbulo deve ser tomada como limitativa ou meramente circunstancial. Mesmo com as indicações das Cortes, esta questão ainda é tida como de difícil solução e sujeita a errros de interpretação (tricky question).[6]
A escolha das expressões de ligação entre os elementos característicos da invenção e os elementos conhecidos do estado da técnica é um fator importante na fixação da proteção. Nos Estados Unidos a formulação das reivindicações em duas partes separada pela expressão caracterizante é pouco usual, e quando isto ocorre, em geral o pedido tem prioridade estrangeira.[7] Janice Mueller observa que mesmo nesta formulação em caso de contrafação deve-se encontrar cada limitação da reivindicação, seja de sua parte caracterizante ou preâmbulo, no objeto acusado de contrafação, seja de forma literal ou equivalente[8]. Em Pentec Inc. v , Grapgic Corp[9], a Corte conclui: “embora o preâmbulo seja um reconhecimento implícito de pertencer ao estado da técnica quando uma forma de reivindicação do tipo Jepson é encontrada ... a invenção reivindicada consiste da combinação do preâmbulo com o aperfeiçoamento”, ou seja, o direito de excluir terceiros que a patente confere é definido pela reivindicação como um todo, ou seja, o aperfeiçoamento que consta na parte caracterizante em combinação com os elementos do preâmbulo[10] Joseph Root destaca que reivindicações deste tipo tem a desvantagem que o titular define com clareza o que ele considera como estado da técnica, o que dificulta ele pleitear tais características em caso de litígio. Tal como dinamite trata-se de uma estratégia com risco de explosão, mas usada de forma adequada, com as devidas precauções tanto as reivindicações do tipo Jepson como a dinamite podem alcançar os resultados desejados.[11] John Thomas observa que muitos advogados não recomendam o uso de reivnidcações do tipo Jepson uma vez que o conteúdo do preâmbulo pode ser usado para mostrar que a mesma está compreendida no estado da técnica e desta forma diminui as chances de justificar a não obviedade da patente em caso de litígio.[12]
Joseph Root destaca nas Cortes que antecederam o Federal Circuit, a CCPA[13] destacava que o preâmbulo de uma reivindicação era considerado como um elemento introdutório e que não deveria ser considerado como limitativo da matéria sendo pleiteada na reivindicação. Em Kropa v. Robie[14] a CCPA nos casos em que o preâmbulo for necessário para “dar vida, sentido e vitalidade à reivindicação” este poderá assumir caráter limitativo, no entanto em geral são considerado como não limitativos. Em Corning Glass Woks v. Sumitomo[15] a reivindicação apresenta preâmbulo que tratava de guia de onda óptico. O titular alegou que o preâmbulo não tinha caráter limitativo de modo que a reivindicação não seria antecipada por anterioridade que tratava de fibra ótica. A Corte, contudo, entendeu que a reivindicação estava restrita aos guias de onda, uma vez que o relatório descritivo não se concentrava em um aperfeiçoamento de fibras ópticas em geral, mas na solução de problemas específicos em um sistema óptico de telecomunicações. Joseph Root destaca que toda vez que uma característica do preâmbulo é usada para distinguir a invenção do estado da técnica, contribuindo para sua não obviedade, a mesma tende a ser considerada como essencial da invenção, e portanto, o preâmbulo assume um significado limitativo.
Em Shumer v. Laboratory Computer Systems[16] uma reivindicação de método de digitalização descreve no preâmbulo elementos do digitalizador tais como sistema de coordenadas, escala, etc, presentes em digitalizadores do estado da técnica. Tais características do preâmbulo são relativas ao produto e não ao método propriamente dito e, portanto, são interpretadas como introdutórias, sem qualquer sentido limitativo. Da mesma forma a descrição de um sistema mais amplo no preâmbulo, no qual a invenção é apenas um componente, segundo Joseph Root igualmente tende a ser interpretado pelas Cortes norte-americanas como não limitativo. Quando esta separação entre preâmbulo e invenção é bem definida, em geral o aspecto limitativo do preâmbulo não gera maiores dúvidas.
Em Pitney Bowes Inc. v. Hewlett Packard[17] a Corte discute um caso em que esta separação não é clara. A reivindicação descreve método para formação de imagem em um fotoreceptor de formas compostas por pontos compreendendo as etapas X, Y, Z. O corpo da reivindicação perde sentido se ignorarmos o fato de que o objetivo é a composição de uma forma composta por pontos. Neste caso, a Corte observou que o preâmbulo está intimamente relacionado com o corpo da reivindicação e, portanto, assume um caráter limitativo: “o preâmbulo é necessário para dar vida, significado e vitalidade à reivindicação”. Joseph Root destaca como estratégia para evitar qualquer dúvida, quando se deseja uma reivindicação mais genérica sem problemas de preâmbulo limitativos, simplesmente reduzir o preâmbulo, como, por exemplo, em “Aparelho compreendendo...”. Em Ex parte Quijano[18] a reivindicação descrevia um dispositivo cirúrgico usado em operações gástricas caracterizado pelos elementos X, Y, Z. O examinador entendeu que a referência á utilização gástrica no preâmbulo não deveria ser considerada como limitativa uma vez que a estrutura descrita se prestava a outras aplicações como em angioplastia. A Corte divergiu do entendimento do examinador concluindo que o preâmbulo deveria ser interpretado como conferindo um aspecto limitativo à reivindicação de modo que o documento relativo à aplicativa em angioplastia não poderia ser utilizado como anterioridade para o dispositivo em análise.
Em Pacing Technologies v. Garmin Int. o Federal Circuit em 2015 conclui que um termo no preâmbulo de uma reivindicação independente pode limitar o escopo de proteção de uma patente quando o mesmo termo do preâmbulo aparece em maior detalhe em uma reivindicação dependente.[19]



[1] Ex parte Jepson , 243 Off. Gazette Patent Office 525 (1917) cf. MPEP 2129; ROOT, Joseph. E. Rules of Patent Drafting from Federal Circuit Case Law. Oxford University Press, 2011, p.237
[2] In re Fout , 675 F.2d 297 USPQ 532 (CCPA 1982); In re Ehrreich, 590 F.2d 902 USPQ 504 (CCPA, 1979) cf. LUNDBERG, Steven; DURANT, Stephen; McCRACKIN, Ann. Electronic and software patents. The Bureau of National Affairs, 2005, p.10-8
[3] 590, F.2d 902 USPQ 504 (CCPA 1979) LUNDBERG, Steven; DURANT, Stephen; McCRACKIN, Ann. Electronic and software patents. The Bureau of National Affairs, 2005, p.9-30
[4] LUNDBERG, Steven.op.cit.p.9-27
[5] Pitney Bowes, Inc. v. Hewlett-Packard Co., 182 F.3d 1298, 1305 (Fed. Cir. 1999); M.P.E.P. 2111.02
[6] http://patentlyo.com/patent/2014/06/struggling-nautilus-technologists.html
[7] http://www.iusmentis.com/patents/uspto-epodiff/
[8] Epcon Gas Sys.v. Bauer Compressors, 279 F.3d at 1029 (Fed. Cir.2002)
[9] 776 F.2d 309 (Fed.Cir 1985)
[10] MUELLER, Janice. Patent Law. New York:Aspen Publishers, 2009, p.95
[11] ROOT, Joseph. E. Rules of Patent Drafting from Federal Circuit Case Law. Oxford University Press, 2011, p.237
[12] THOMAS, John. The responsibility of the rulemaker: comparative approaches to patent administration reform, v.17, 2002, Berkeley Technology Law Joournal, p.727-756 cf. DRAHOS, Peter. The global governance of knowledge: patent offices and their clients. Cambrige University Press:United Kingdom, 2010, p.87
[13] In re Wolfe, 69 F.2d 550 (CCPA, 1934) cf. ROOT, Joseph. E. Rules of Patent Drafting from Federal Circuit Case Law. Oxford University Press, 2011, p.221
[14] 187. F2d 150 (CCPA 1951) cf.ROOT.op.cit.p.221
[15] 868 F.2d 1251 (Fed.Cir.1989) cf.ROOT.op.cit.p.222
[16] 308 F.3d 1304 (Fed.Cir.2002) cf.ROOT.op.cit.p.224
[17] 182 F.3d 1298, 51 USPQ.2d (BNA) 1161 (Fed.Cir.1999) cf.ROOT.op.cit.p.230
[18] Appeal 2010-005756 (2012) Serial No. 11/263302 http://www.lexology.com/r.ashx?i=2892512&l=7GGAYVA
[19] http://www.cafc.uscourts.gov/images/stories/opinions-orders/14-1396.Opinion.2-13-2015.1.PDF

quinta-feira, 26 de março de 2015

Proteção do conhecimento indígena

A pervinca-cor-de–rosa, descoberta na floresta tropical de Madagascar contém uma característica genética única que pode ser usada como produto farmacêutico para certos tipos de cancro. A Eli Lilly, a companhia farmacêutica que desenvolveu a droga, obteve lucros de US$160 milhões em 1993 com sua venda, ao passo que Madagascar não recebeu um centavo de compensação pela expropriação de um dos seus recursos naturais [1]. O bioquímico inglês Conrad Gorinsky, que viveu até os 17 anos junto a comunidade dos wapixanas de Roraima, patenteou (EP610059, US5786385) o princípio ativo do cunaniol, registrado pelo químico como polyacetylenes, obtido do arbusto Cunani (Clibatium sylvestre). A substância é apontada como um poderoso estimulante do sistema nervoso central, um neuromuscular capaz de reverter quadros de bloqueio do coração, porém o pesquisador se negou a pagar qualquer compensação aos wapixanas [2].

Nos Estados Unidos, em maio de 2008, uma decisão judicial condenou o norte americano Larry Proctor por prática de biopirataria. O empresário, dono de uma empresa de sementes, encontrou no México um feijão amarelo, que adquiriu e plantou no Colorado. Em seguida, afirmando que o feijão seria o resultado de cruzamentos únicos no mundo, batizou-o no USPTO com o nome da mulher e patenteou-o em 1996 como feijão Enola (US5894079). Quando as empresas mexicanas começaram a exportar esse feijão para os EUA a Proctor exigiu o pagamento de 60 centavos de dólar por cada libra de feijão importada, para proteger o seu mercado. Os agricultores mexicanos não podiam pagar e as importações sofreram uma forte queda. Desde 2001, a FAO e o Centro Internacional para a Agricultura Tropical (CIAT) têm tentado recuperar a patente do feijão, e conseguiram provar que o “feijão Enola” era uma espécie já conhecida e identificada no banco de sementes do CIAT situado na cidade colombiana de Cali e que possui a maior reserva de feijão do mundo, com mais de 35 mil variedades [3].

Estudos divulgados pela OMPI[4] examinam a forma de se proteger tais conhecimentos e as possibilidades de uma proteção específica, sui generis. A Índia criou em 2005 uma base de dados digital sobre conhecimento tradicional chamada TKDL (Traditional Knowledge Digital Library)[5] e contribuiu junto à WIPO para o desenvolvimento de um esquema de classificação detalhado nesta área como forma de facilitar o acesso a estes documentos nas buscas de patentes. Carlos Correa aponta que os movimentos em defesa do acesso ao conhecimento A2K que defendem a flexibilização das leis de propriedade intelectual divergem com relação a necessidade de defesa dos direitos de conhecimento tradicional[6]. Enquanto alguns por coerência alegam que tais conhecimentos não devam ser protegidos alguns segmentos do mesmo movimento A2K alegam que seria necessário garantir a defesa de tais direitos para as comunidades tradicionais. O Panamá tem em sua legislação de 2002 uma previsão de proteção de tais conhecimentos tradicionais de povos indígenas. O Peru também possui legislação similar relativa a recursos biológicos, muita embora tenha atraído pouco interesse dos povos indígenas.[7] Carlos Correa aponta que a própria definição do que constitua domínio público varia segundo as legislações nacionais o que dificulta um acordo internacional para proteção de conhecimentos tradicionais. A Declaração da ONU sobre os direitos de povos indígenas de setembro de 2007 prevê no artigo 31 que os povos indígenas  “tem o direito de manter, controlar, proteger e desenvolver sua propriedade intelectual sobre sua herança cultural, conhecimento tradicional e expressões culturais tradicionais”.[8] Com relação as dificuldades dos povos indígenas exercerem seus direitos de propriedade, Carlos Correa aponta como solução o papel das ONGs, como foi o caso da ayahuasca (banisteriopsis caapi) patenteada pelo pesquisador Loren Miller nos Estados Unidos e que teve a patente anulada por intervenção da Coordenadoria das Organizações Indígenas da Bacia Amazônica (Coica), pela Aliança para os povos Indígenas e Tradicionais da Bacia Amazônica e pelo Centro de Direito Internacional do Meio Ambiente (Ciel).

Segundo o TOREF (Tratado da OMPI sobre as Representações ou Execuções e sobre os Fonogramas), em vigor em maio de 2002, os direitos conexos também podem ser utilizados para proteger a expressão cultural, em grande parte não escrita, de muitos países em desenvolvimento. O folclore pode deste modo ser protegido indiretamente. A recompensa financeira por tais representações ou execuções e por tais fonogramas muitas vezes reverte à comunidade donde provém o folclore, embora isto aconteça menos frequentemente no caso do produtor de fonogramas[9]. Jerome Reichman critica os países desenvolvidos que moldaram o direito autoral de tal forma a poder proteger programas de computador no entanto argumentam que não possível qualquer adaptação no direito autoral para que se possa a proteger o folclore.[10]

O fato de muitas vezes o autor da obra folclórica em questão ser desconhecido não constitui impedimento para a proteção por direito autoral que expressamente provê no artigo 45 inciso II da Lei 9610/98 que “além das obras em relação às quais decorreu o prazo de proteção aos direitos patrimoniais, pertencem ao domínio as de autor desconhecido, ressalvada a proteção legal aos conhecimentos étnicos e tradicionais”. No caso de obras de artesanato, Antonio Chaves, mesmo sob a égide da LDA 5988/73 que permite a reprodução em caso de exemplar único (dispositivo não mais presente na LDA 9160/98), entende ser tal obra protegida por direito autoral e conclui: “entendemo-nos na demonstração do absurdo da interpretação de que quem adquire uma peça de obra de arte plástica obtém o direito de reproduzi-la ou expô-la ao público”[11].

Denis Barbosa, contudo, chama a atenção de que a ênfase excessiva dos países menos desenvolvidos na proteção de conhecimentos tradicionais e folclore, talvez possa estar desviando o foco para questões mais importantes: “Ante a importância da difusão da tecnologia, e do acesso à informação gerada pelos setores mais dinâmicos da economia e da criação contemporânea, tais valores tradicionais são certamente significativos. No entanto, qualitativa e quantitativamente, são marginais. Os remédios contra a AIDS, se não fossem licenciados compulsoriamente, não poderiam ser substituídos pelo encantamento de algum pajé. Concentrar em tais temas a libido dos países em desenvolvimento é deixar que os dedos se percam, para concentrar a atenção nos anéis que ficam, em toda sua cintilante irrelevância”[12].

Cláudio Barbosa questiona a existência do conceito usual de novidade em patentes para tais conhecimento tradicionais: “Ainda que alguns doutrinadores considerem que esses conhecimentos tradicionais não estejam em domínio público, tal construção doutrinária não apresenta prima facie elementos suficientes de convencimento, ainda que o mesmo seja considerado uma propriedade coletiva. Mesmo sem a concordância de que os objetivos para a proteção dos conhecimentos tradicionais são genuínos e humanitários, os mesmos escapam do enfoque à proteção dos bens intelectuais, recaindo no conceito de proteção ao domínio público”.[13]



[1] RIFKIN, Jeremy. O século Biotech: dominando o gene e recriando o mundo. Portugal: Publicações Europa-América, 2000, p. 58.
[2] http: //www.redetec.org.br/inventabrasil/cunan.htm.
[3] Biopirataria sofre revés nos EUA mai. 2008 http: //www.esquerda.net/content/biopirataria-sofre-rev%C3%A9s-nos-eua.
[4] http://www.wipo.int/meetings/en/details.jsp?meeting_id=4795
[5] DRAHOS, Peter. The global governance of knowledge: patent offices and their clients. Cambrige University Press:United Kingdom, 2010, p.218
[6] ATTEBERRY, Jeffrey. Information/Knowledge in the global society control: A2K theory and post
Colonial commons; SELL, Susan. A comparision of A2K movements: rom medicines to farmers. In: KRIKORIAN, Gaelle; KAPCZYNSKI, Amy. Access to knowledge in the age of intellectual property, Zone Books: Nova Iorque, 2010, p.329, 408
[7] CORREA, Carlos. Acess to knowledge: the case of indigenous and traditional knowledge. In: KRIKORIAN, Gaelle; KAPCZYNSKI, Amy. Access to knowledge in the age of intellectual property, Zone Books: Nova Iorque, 2010, p.243
[8] CORREA, Carlos. Acess to knowledge: the case of indigenous and traditional knowledge. In: KRIKORIAN, Gaelle; KAPCZYNSKI, Amy. Access to knowledge in the age of intellectual property, Zone Books: Nova Iorque, 2010, p.246
[9] Curso DL-201 WIPO – Direitos Autorais
[10] MAY, Christopher; SELL, Susan. Intellectual Property Rights: a critical history. Lynne Rjenner Publishers: London, 2006, p.5
[11] Direito de Autor: princípios fundamentais, Antonio Chaves, Rio de Janeiro:Forense, 1987, p.298
[12] Usucapião de patentes e outros estudos de propriedade industrial, Denis Barbosa. Rio de Janeiro:Ed. Lumen Juris, 2006, p.443
[13] BARBOSA, Cláudio. Propriedade Intelectual: introdução à propriedade intelectual como informação. Rio de Janeiro:Elsevier, 2009, p.110

terça-feira, 24 de março de 2015

A ineficácia do 1.1 para fins do parágrafo 2° do artigo 11 da LPI

Devidos a atrasos na análise de exame formal do pedido PCT que entra na fase nacional no INPI (código de publicação 1.3 na RPI) o INPI inciou em agosto de 2011 a publicação do código 1.1 na RPI com base na comunicação da publicação internacional do pedido internacional nos termos do PCT e da apresentação de petição de requerimento de entrada na fase nacional com base em dados obtidos do Patentscope da OMPI. Esta publicação 1.1 foi criada meramente para fins estatísticos diante dos atrasos na publicação do 1.3 por parte do INPI, contudo não pode ser considerada como uma confirmação de entrada na fase nacional. Uma vez realizado o exame de admissibilidade do pedido PCT o INPI publica na RPI a entrada na fase nacional (código 1.3) caso aprovado neste exame ou a retirada do pedido (código 1.2) caso não aprovado neste exame. No caso de não aprovado no exame de admissibilidade não se considera o pedido como tendo sido depositado no Brasil para fins de parágrafo 2º do artigo 11 da LPI.  No caso de não aprovação no exame de admissibilidade do pedido o artigo 216 parágrafo 2º permite o arquivamento da petição de entrada com possibilidade de recurso pela falta de procuração e não o arquivamento definitivo do pedido pois considera a entrada uma mera petição e não um pedido de patente nacional. O depósito no Brasil somente é confirmado quando da publicação do 1.3. Nesse sentido podemos concluir que o parágrafo 3º do artigo 11 da LPI é inócuo quanto aos pedidos PCT uma vez que os mesmos se atendendo ao parágrafo 2º necessariamente terão sofrido processamento nacional. Portanto, como a publicação 1.1 não produz qualquer certeza quanto ao resultado do exame de admissibilidade, não poderá ser considerado como publicação relevante para fins de utilização deste documento no exame de novidade na situação do artigo 11 parágrafo 2º da LPI, o examinador deverá aguardar a publicação do 1.3 para ter esta certeza.
Este entendimento do que se entende por depósito nacional está em concordância com o argumento de Bodenhausen[1] sobre o artigo  4, A(3) da CUP que define o que constitui um depósito nacional regular para fins de aferiação de prioridade unionista. Este conceito pode ser utilizado para discussão do artigo 11 na medida em que o mesmo também trata da definição de depósito nacional. Bodenhausen observa que esta definição esteve sujeita a grande debate na Revisão de 1958 da CUP e foi sanada com o dito parágrafo do artigo 4º da CUP. Segundo Bodenhausen um depósito nacional existe quando, de acordo com a legislação doméstica do país em que ocorrer o depósito,o pedido esttá depositado corretamente quanto aos aspectos formais (ou seja, foi aprovado em exame formal), ainda que esteja incompleto ou não seja patenteável, por exemplo. O destino subsequente deste pedido, se por exemplo, for retirado ou indeferido não descaracteriza o fato de que o mesmo continua sendo considerado como pedido depositado no país. Assim, o pedido depositado no Brasil é confirmado com a publicação de aprovação ao exame formal (código 2.1) ou, no caso de pedidos PCT, com a publicação da aprovação no exame de admissibilidade (código 1.3). Para aplicação do parágrafo 2º do artigo 11 é necessário ainda que o pedido seja publicado, o que sempre se verifica no caso dos pedidos PCT depositados no Brasil (a publicação foi realizada na fase internacional) e que ocorre nos pedidos nacionais pela publicação 3.1 (Publicação do pedido de patente ou de certificado de adição de invenção), 3.2 (Publicação antecipada) ou 3.6 (Publicação do pedido arquivado definitivamente Art.216 §2° e Art.17 §2° da LPI).




[1] BODENHAUSEN. Guide to the application of the Paris Convention for the protection of industrial property, Paris,1967 http://www.wipo.int/edocs/pubdocs/en/intproperty/611/wipo_pub_611.pdf

domingo, 22 de março de 2015

Prioridade Unionista da CUP na EPO

Um dos princípios da Convenção de Paris é o da prioridade unionista prevista no Artigo 4º (Artigo 16 da LPI), que estabelece que aquele que tiver apresentado pedido de patente em um dos países da União gozará para apresentar o pedido nos outros países, do direito de prioridade durante o prazo de doze meses para patentes de invenção. A Convenção de Bruxelas, de 1900, estendeu este prazo originalmente de seis para doze meses.
Na EPO em G 2/98 OJ 2001 a prioridade será concedida apenas para a mesma matéria depositada originalmente ou matéria derivada do conteúdo originalmente reivindicado de forma direta e não ambígua utilizando-se do conhecimento de um técnico do assunto à época do depósito original [1]. Não se faz portanto necessário haver uma identidade exata do pedido depositado com o documento de prioridade para que o pedido depositado faça juz a data de prioridade. T828/93 OJ 1996 considera que características triviais adicionadas ao pedido podem ser desconsideradas assim como aquelas que meramente limitam  a extensão da patente sem fazer qualquer contribuição técnica à invenção.[2] T73/88 OJ 1993 distingue entre as características técnicas consideradas essenciais para determinação do escopo da patente e as consideradas essenciais para fins de determinação de prioridade. Uma característica reivindicada que não altera a natureza da invenção não necessita de estar presente no documento de prioridade para que a reivindicação tenha o direito de prioridade garantido. Em T409/90 OJ 1993 se um documento de prioridade revela uma invenção de forma genérica isto não significa que uma implementação específica tenha sido revelada, pois esta não pode ser encontrada no documento de prioridade de forma direta e de não ambígua. Em T131/92 OJ 1994 um processo de produção de mucopolissacarídeos mostra uma reivindicação em que se pleiteia de 2000 a 8000 daltons de peso molecular embora o documento de prioridade se refira a uma faixa de 3000 a 6000 daltons. A prioridade foi negada porque as propriedade dos produto fora da faixa prevista no documento de prioridade não eram idênticas às reivindicadas. Nos casos em que a faixa de valores na reivindicação meramente restringe uma faixa mais genérica do documento de prioridade sem que a natureza da patente seja modificada G2/98 OJ 2001 conclui que a prioridade deva ser aceita. T16/87 OJ 1992 conclui que apenas nos casos em que o elemento presente na reivindica que não está presente no documento de prioridade, for capaz de modificar a natureza da invenção, ou seja, modificação esta que conduzisse a uma nova invenção, é que teremos um caso em que a prioridade não deva ser aceita para esta reivindicação, caso contrário tal elemento será considerado como não essencial para a invenção reivindicada e como tal não destitui a mesma da data de prioridade.[3]



[1] G_0002/98 http: //legal.european-patent-office.org/dg3/biblio/g980002ep1.htm
[2] STAUDER, Dieter; SINGER, Margareth; European Patent Convention: a commentary.  Thomson:Cologne, 2003, p. 411
[3] STAUDER, Dieter; SINGER, Margareth; European Patent Convention: a commentary.  Thomson:Cologne, 2003, p. 417

terça-feira, 17 de março de 2015

Reivindicações alternativas de mesma categoria ?

Segundo o Ato Normativo 127/97 item 15.1.3.2.1.b e Instrução Normativa nº 30/2013 artigo 5° inciso 2: “Cada reivindicação independente deve corresponder a um determinado conjunto de características essenciais à realização da invenção, sendo que somente será admitida mais de uma reivindicação independente da mesma categoria se tais reivindicações definirem diferentes conjuntos de características alternativas e essenciais à realização da invenção, ligadas pelo mesmo conceito inventivo”. Faz parte da estratégia do requerente buscar a melhor forma de proteção de sua invenção tendo em vista potenciais contrafatores. Assim, uma implementação em computador conectado em rede pode conter uma reivindicação independente que descreva as operações no lado do cliente, uma outra reivindicação que descreva as operações do lado do servidor, e uma terceira reivindicação independente que descreva o sistema ou a rede como um todo.[1] A Diretriz no Módulo 1 item 3.128 “Formas alternativas de uma invenção podem ser reivindicadas tanto em uma pluralidade de reivindicações independentes, como indicado em 3.108, ou em uma única reivindicação”. Segundo os itens 3.22 e 3.23: “Para cada categoria de reivindicação pode haver pelo menos uma reivindicação independente. O examinador deve ter em mente que a presença de reivindicações de diversas categorias redigidas de modo diferente, mas aparentemente de efeito similar, é uma opção de proteção da depositante à qual o examinador não deve se opor por meio de uma abordagem rigorosa, mas sim se atendo a uma proliferação desnecessária de reivindicações independentes”. O artigo 25 define que As reivindicações deverão ser fundamentadas no relatório descritivo, caracterizando as particularidades do pedido e definindo, de modo claro e preciso, a matéria objeto da proteção. Não há na LPI referência direta a falta de concisão do quadro reivindicatório.
Uma reivindicação dependente constitui uma forma abreviada se se escrever uma reivindicação independente de modo que se rejeitar reivindicações independentes seria o mesmo que rejeitar reivindicações dependentes. Considere por exemplo reivindicação independente para escova de dentes possuindo cabo e cerdas caracterizado por ter cerdas duplas.  Uma reivindicação dependente válida poderia ser escova de dentes conforme a reivindicação anterior caracterizado pelas cerdas serem de material elástico. Esta mesma reivindicação dependente deve ser lida em conjunto com a reivindicação independente a qual depende: escova de dentes possuindo cabo e cerdas elásticas caracterizado por ter cerdas duplas. Esta nova reivindicação independente e a reivindicação dependente anterior possuem exatamente o mesmo escopo de modo que não faz sentido considerá-la como uma violação do artigo 25 por falta de precisão, enquanto que na forma de reivindicação dependente esta objeção comumente não é levantada.
Muitas vezes o requerente opta por diferentes reivindicações independentes, cada qual com um foco distinto sobre a invenção, no intuito de facilitar os procedimentos de licenciamento. Considere uma invenção[2] que trate de um mecanismo para prolongar a vida útil de uma bateria em uma lanterna que envolve um novo compartimento para a bateria na lanterna em que uma peça de cobre em formato cilíndrico, tendo um receptáculo macho que é pressionado sob a bateria, quando a unidade é inserida em uma lanterna que também possui uma peça em cobre no mesmo formato cilíndrico, tendo receptáculo fêmea. Uma reivindicação que descreva as modificações na lanterna junto com as modificações na bateria poderia tornar difícil o licenciamento para os fabricantes de lanterna e baterias em separado, uma vez que cada parte, por fabricar apenas parte da reivindicação, poderia não estar devidamente resguardado contra contrafações. Nesse sentido o titular poderia requerer uma reivindicação com foco na lanterna e outra com foco na bateria:
Mecanismo de economia de energia de bateria de lanterna caracterizado por:
lanterna operada por bateria tendo fiação elétrica; e
peça de cobre no formato cilíndrico tendo um receptáculo fêmea, a peça de cobre no formato cilíndrico ligada à fiação elétrica da lanterna operada por bateria, em que a peça de cobre no formato cilíndrico que apresenta um receptáculo fêmea é adaptada para operar acoplada à peça no formato cilíndrico que apresenta receptáculo macho fixado a uma bateria
Mecanismo de economia de energia de bateria de lanterna caracterizado por:
bateria; e
peça de cobre no formato cilíndrico tendo um receptáculo macho, a peça de cobre no formato cilíndrico sendo operacionalmente acoplada à bateria, em que a peça de cobre no formato cilíndrico que apresenta um receptáculo macho é adaptada para operar acoplada a uma peça de cobre no formato cilíndrico que apresenta um receptáculo fêmea, que está conectada à fiação elétrica em uma lanterna.

O Artigo 84 da EPC estabelece que as reivindicações devem ser claras e concisas e fundamentadas no relatório descritivo. Na EPO a Regra 43(2) em vigor a partir de 2002 estabelece que o número de reivindicações independentes é limitada em apenas uma por categoria, exceto nos casos de produtos interrelacionados (por exemplo plug e soquete, transmissor e receptor), diferentes usos de um produto ou aparelho ou soluções alternativas para o mesmo problema no qual é inadequada a reivindicação de uma única reivindicação.[3] Segundo o Guia de Exame se for possível abranger soluções alternativas por uma única reivindicação o depositante deverá fazê-lo. Assim auperposições e similaridades de características de reivindicações de mesma categoria são um indicativo de que seria apropriado substituir tais reivindicações por uma única reivindicação independente. Por exemplo se uma reivindicação descreve escova de dentes caracterizada por cabo de plástico e outra reivindicação independente de escova de dentes caracterizada por cabo de madeira, demonstram falta de concisão, devendo ser substituídas por reivindicação independente de escova de dentes caracterizada por cabo de plástico ou madeira.
O pedido EP1454202 pleiteia na primeira reivindicação independente ferramenta de manutenção de campo que utiliza um protocolo de comunicação padrão na indústria, possui primeira e segunda unidades de acesso ao meio físico, processador, teclado, vídeo, e porta infravermelha para se comunicar sem fio a um dispositivo externo.Um segunda reivindicação independente descreve os mesmos elementos da primeira reivindicação, exceto pelo fato que substitui a porta infravermelha por um módulo de memória removível. Uma terceira reivindicação independente substitui o mesma porta infravermelha da primeira reivindicação por um módulo de expansão de memória. O quadro reivindicatório tem apenas 17 reivindicações sendo três reivindicações independentes de ferramenta de manutenção e três reivindicações independentes de método. O exame da EPO considerou que a existência destas três reivindicações independentes de mesma categoria contraria  o Artigo 84 da EPC[4] por falta de concisão e falta de clareza: “na verdade as várias terminologias usadas introduzem três reivindicações independentes que confundem o escopo preciso do monopólio pretendido [...] As três reivindicações apresentam diferentes formas de expressar essencialmente as mesmas características. Estas três alternativas deixam o leitor em dúvida sobre quais são de fato as características essenciais da invenção e desta forma o Artigo 84 não é satisfeito”. O exemplo mostra que a Regra 43(2) tem sido aplicada com certo rigor na EPO.
Em T56/01 a Corte entendeu que reivindicações independentes de produto que possuam escopo de proteção que se superpõem não podem ser vistas como soluções alternativas. As reivindicações em questão foram vistas como relativas à mesma solução técnica com pequena diferença em sua redação, de modo que dadas as similaridades entre as duas reivindicações as mesmas contrariavam disposição da Regra 43(2)(c) da EPC sendo mais apropriado a redação das mesmas em uma única reivindicação independente. [5] Em T671/06 a Corte entendeu que um sistema compreendendo uma fonte de alimentação reivindicada em termos funcionais amplos e uma outra reivindicação independente pleiteando a mesma fonte em termos estruturais não pode ser considerada como produtos inter-relacionados. Para tanto seria necessário que se demonstrasse uma interação entre elementos complementares tais como um plugue e um soquete, por exemplo. [6] Embora válida em exame de primeira instância, T263/05 observa que esta regra de concisão que limita o número de reivindicações independentes de uma mesma categoria (Regra 43 da EPC) não se aplica nos casos de nulidade. [7] A perspectiva da EPO portanto é bem mais restritiva quando, comparada a diretriz do INPI, na aceitação de reivindicações independentes de mesma categoria.
No Japão o Artigo 36(6)(iii) do Patent Act prevê que cada reivindicação deve ser concisa, de modo que não há restrições de uma reivindicação por categoria ou por conceito inventivo, por questões de concisão. Na Coreia (Guideline Part II, Chapter 4, 4) estabelece que no caso de uma reivindicação prolixa, a repetição de conteúdos idênticos deve ser evitada pois isto pode representar uma reivindicação sem clareza. Não há contudo limitação quanto o número total de reivindicações independentes. Na China um pedido não deve possuir duas ou mais reivindicações tendo substancialmente o mesmo escopo de proteção. No intuito de se evitar repetições o requerente deve optar pelo uso de reivindicações dependentes que se referiam a reivindicações precedentes. Não há restrições quanto ao número de reivindicações por categoria.
As Diretrizes do PCT reconhece que há divergência entre os países membros sobre o significado do termo “concisão” e destacam que as Autoridades de Exame e Busca podem adotar um dos dois critérios neste aspecto: 1) uma objeção pode ser apresentada nos casos em que as reivindicações são indevidamente multiplicadas em um número “não razoável de reivindicações” ou são duplicadas: “as reivindicações não devem ser indevidamente multiplicadas de modo a obscurecer a definição da matéria reivindicada em uma intrincada confusão. Contudo de as reivindicações diferem uma das outras e não há dificuldade em entender o escopo de proteção de cada uma, uma objeção nesse sentido não deve ser aplicada”, 2) deve se fazer objeção nos casos de uso repetitivo de palavras ou a multiplicidade de reivindicações de natureza trivial que torne trabalhoso determinar a matéria protegida pela patente. O que significa um número razoável de reivindicações deve ser analisado caso a caso. As duas opções parecem igualmente flexíveis. A Regra 6 do PCT estabelece que o número de reivindicações deve ser considerado razoável[8]. Neste sentido um quadro reivindicatório com um número excessivo de reivindicações independentes de mesma categoria e de escopo similar, em geral, deve ser restringido no intuito de garantir maior concisão ao objeto de proteção[9]. Nas duas opções a preocupação parece residir na construção de quadros reivindicatórios intrincados com muitas reivindicações. De fato no pedido equivalente WO03050625 ao EP1454202 citado anteriormente que era relativo a apenas três reivindicações cada qual razoavelmente clara em seu escopo, a Autoridade de Busca e Exame (a mesma EPO) não entendeu que houvesse qualquer problema de concisão ou clareza no quadro reivindicatório segundo as regras do PCT, o que mostra que as regras da EPC são mais rígidas que as aplicadas pelo PCT. O Curso de redação de patentes da OMPI DL320 observa que muitas legislações de patentes estabelecem que o pedido de patente não pode conter mais de uma reivindicação independente por categoria.



[1] LUNDBERG, Steven; DURANT, Stephen; McCRACKIN, Ann. Electronic and software patents. The Bureau of National Affairs, 2005, p.10-8
[2] Manual de Redação de Patentes da OMPI, IP Assets Management Series, 2007, p.199
[3] EPO Guidelines 2010, Part C, Chapter III item 3.2 http://www.epo.org/law-practice/legal-texts/html/guiex/e/c_iii_3_2.htm
[4] The claims shall define the matter for which protection is sought. They shall be clear and concise and be supported by the description
[5] Case Law of the Boards of Appeal of the European Patent Office Sixth Edition July 2010, p. 271 http://www.epo.org/law-practice/case-law-appeals/case-law.html
[6] Case Law of the Boards of Appeal of the European Patent Office Sixth Edition July 2010, p. 272 http://www.epo.org/law-practice/case-law-appeals/case-law.html
[7] Case Law of the Boards of Appeal of the European Patent Office Sixth Edition July 2010, p. 273 http://www.epo.org/law-practice/case-law-appeals/case-law.html
[8] item 9.25 PCT International Search and Preliminary Examination Guidelines, PCT Gazette, Special Issue, WIPO, 25 março 2004, S-02/2004
[9] item A5.42[1] The claims should not be unduly multiplied so as to obscure the definition of the claimed invention in a maze of confusion. PCT International Search and Preliminary Examination Guidelines, PCT Gazette, Special Issue, WIPO, 25 março 2004, S-02/2004

segunda-feira, 9 de março de 2015

Patentes de métodos de contracepção

Em T820/92 OJ 1995 a Corte européia entendeu que um método contraceptivo será patenteável desde que não esteja embutido qualquer combinação com método terapêutico[1]. Segundo esta decisão uma etapa cirúrgica em um processo de múltiplas etapas confere ao método como um todo o caráter cirúrgico e desta forma excluindo-o de patenteabilidade.[2] Em T74/93 a Corte discutiu a patenteabilidade de método contraceptivo que incluía a aplicação de um creme na mulher. A Corte conclui que não caberia a rejeição do método por falta de aplicação industrial (Artigo 57 EPC1973). Ademais gravidez não é enquadrada como doença e portanto sua prevenção não pode ser considerada como método terapêutico. O fato do método ser de uso privado, excluído de contrafação, não impediria do titular usar sua patente contra terceiros alegam infração por contribuição, o que mostra que a exclusão de uso privado não é suficiente para tornar a patente inócua, o que mostra a necessidade de argumentos para anulação da patente. [3]Philip Grubb observa que neste caso um dos argumentos usados em defesa da aplicação industrial foi o fato de que prostitutas poderiam usar o produto para evitar gravidez.[4]
Segundo Manual DIRPA de 1994 “invenções relacionadas a processos intermediários de diagnose, tais como métodos e processos de ensaio de investigação de episódios fisiológicos (gravidez) e processo ou métodos de separação de fluidos e líquidos fecundantes (processo de separar células de esperma de sêmen), embora não representem um método de diagnóstico, propriamente dito, são incluídos nas proibições do artigo 9g do CPI, por apresentarem como finalidade básica a elaboração de diagnóstico (da mesma forma que os produtos intermediários para medicamentos)[5]. Para Pontes de Miranda “a prenhez não é doença, de jeito que os meios para facilitação são patenteáveis; e os meios para o parto sem dor”.[6] Nesse sentido não se pode enquadrar tais métodos como terapêuticos. No caso de kits de testes estes constituem produtos e não processos, sendo portanto patenteáveis. Quando ao método, deve-se ter em mente que gravidez não é doença o que, portanto, não caracteriza como método terapêutico. Ademais tais testes não requerem a presença de um especialista para se chegar ao resultado final do teste e sua interpretação. O INPI tem contudo questionado a aplicação industrial de tais métodos. Em PI0113902 trata de processo de contracepção e forma de administração do mesmo e teve indeferimento mantido na fase recursal: “O processo para contracepção ora pleiteado é certamente um processo unicamente pessoal conduzido de forma privada pela própria mulher. Diferente do que entende a recorrente, não há qualquer indústria que ofereça o processo de contracepção ora pleiteado para aplicação na mulher no lugar dela mesma. Corroborando o entendimento exarado em primeira instância, no processo de contracepção, não se consegue vislumbrar outra aplicação que não a a decisão privada e individual de uma mulher em usar um método que previna a gravidez indesejável, administrando a si mesma um produto em esquema individual estabelecido entre ela e seu médico e podendo variar de mulher para mulher, independente da forma de apresentação do contraceptivo”.



[1] In T 820/92 (OJ 1995, 113) a claimed invention consisting of a contraceptive method involving a concurrent therapeutic step was refused by the examining division on the grounds that the claims did not comply with the requirements of Art. 57 EPC. In na official communication pursuant to Art. 110(2) EPC the board stated that consideration had to be given to the question of whether the combination of a contraceptive method with a therapeutic method was excluded from patentability under Art. 52(4) EPC. The appellant argued that therapy was not the subject of the claims, and that in particular the method claims were directed to the prevention of pregnancy and not to a therapeutic application, so that no exclusion under Art. 52(4) EPC should apply.[CaseLaw of the Boards Of Appeal of the EPO, 2006, p.104]
[2] STAUDER, Dieter; SINGER, Margareth; European Patente Convention: a commentary.  Thomson:Cologne, 2003, p. 79
[3] WADLOW, Christopher. Utility and industrial applicability. In: TAKENAKA, Toshiko. Patent law and theory: a handbook of contemporary research,Cheltenham:Edward Elgar, 2008, p.380
[4] GRUBB, Philip, W. Patents for Chemicals, Pharmaceuticals, and Biotechnology: Fundamentals of Global Law, Practice, and Strategy; Oxford University Press, 2004, p.283
[5] Diretrizes de análise de patentes, proposta para discussão, 1a versão, agosto 1994, INPI/DIRPA, p.102
[6] MIRANDA, Pontes. Tratado do Direito Privado, Rio de Janeiro:Borsoi, tomo XVI, 1956, p.374

sexta-feira, 6 de março de 2015

Excesso de reivindicações

Segundo o Ato Normativo 127/97 item 15.1.3.2.1.b e Instrução Normativa nº 30/2013 artigo 5° inciso 2: “Cada reivindicação independente deve corresponder a um determinado conjunto de características essenciais à realização da invenção, sendo que somente será admitida mais de uma reivindicação independente da mesma categoria se tais reivindicações definirem diferentes conjuntos de características alternativas e essenciais à realização da invenção, ligadas pelo mesmo conceito inventivo. Nos casos em que o requerente pleiteie um novo medicamente e apresente diversas reivindicações independentes de uso, cada qual considerada inventiva, estas poderão ser admitidas por serem consideradas alternativas e unidas pelo mesmo conceito inventivo. Nos Estados Unidos John Robb observa que embora o depositante possa elaborar um quadro reivindicatório com reivindicações amplas e restritas para melhor se proteger isso não confere o direito de ter concedida uma patente com diversas reivindicações que pleiteiam o mesmo objeto, e cita como exemplo US1160071 com 797 reivindicações ou US1043882 com seis páginas de relatório descritivo e trinta e nove páginas de reivindicações[1]. John Robb cita casos em que as Cortes condenam quadro reivindicatórios prolixos que tem como objetivo “constranger o inventor e induzir ao erro o público”. A Suprema Corte em Carlton v. Bokee conclui: “quando o relatório descritivo por ambiguidade e um desnecessário multiplicação de reivindicações nebulosas é feita com intuito de enganar o público, a patente é nula”. A Corte Federal em Benjamin v. Dale condenou o número excessivo de reivindicações que tem como objetivo “simplesmente tornar trabalhosa a interpretação das reivindicações”. As Cortes inglesas seguindo a doutrina em Carlton v. Bokee em Linotype and Machinery Ltd v. Hopkins conclui: “o réu depositou um relatório descritivo que mais parece um tratado por sua extensão, que contém nada menos do que 60 reivindicações, onde há uma infinita redundância e repetição e referência constante aos desenhos que não são simples de acompanhar. Em seu conjunto trata-se de um documento que necessita  um estudo penetrante e prolongado de modo que alguém possa entender o problema a que se propõe resolver a invenção nesta classe de indústria que ela se encontra de modo que possam estar livres do risco de infração [...] Em outras ocasiões eu já observei uma tendência de se elaborar descrições e reivindicações que são verdadeiros quebra cabeças a desafiar um estudante e a amedrontar homens de negócios com medo de terem uma interpretação errônea e assim possam se encontrar acusados de infração. Isto é um abuso da lei e que deve ser verificado, se a ocasião assim ocorrer, pelo simples processo de se declarar a patente inválida”.[2]



[1] ROBB, John. Patent essentials for the executive, engineer, lawyer and inventor, New York: Funk & Wagnalls Co., 1928, p.190
[2] ROBB, John. Patent essentials for the executive, engineer, lawyer and inventor, New York: Funk & Wagnalls Co., 1928, p.203

domingo, 1 de março de 2015

Unidade de invenção: justificativa fiscal

O PCT indica que caso as demais invenções presentes no mesmo pedido e destituídas de unidade de invenção tenham o mesmo campo de classificação, o examinador, por economia processual poderá proceder também as buscas destas invenções. Tais buscas serão complementadas quando do exame do pedido dividido[1]. Segundo a OMPI[2]a regra para a unidade de invenção é, essencialmente, um mecanismo de regulamentação de taxa, que evita que os Escritórios Nacionais de Patentes tenham que examinar um excesso de invenções separadas para um requerente que pagou apenas pelo exame de uma única invenção”. Jeremy Scott e Sytse Jonge também entendem que a questão da divisão de pedidos por parte do escritório de patentes é uma tentativa de manter o trabalho de busca compatível com a taxa de exame paga pelo requerente.[3]
Segundo Gama Cerqueira: “referida orientação se justifica por motivos de ordem fiscal, como pela necessidade de se fixar claramente o objeto da patente e do direito do inventor. Não infringe o dispositivo da lei a patente requerida para um processo e o respectivo produto, para uma máquina e seu uso, ou para a invenção que comporte várias aplicações resultantes da mesma ideia inventiva ou suscetível de diversas formas de aplicação[4]. Tinoco Soares destaca como razões para o critério de unidade de invenção as de caráter financeiro e as de ordem prática uma vez que “os examinadores, dentro de suas especialidades, não podem conhecer senão o objeto patenteável de sua competência. Se o pedido tem vários objetos, a pesquisa mais complicada corre o risco de ser viciada”.[5] O autor também lista as dificuldades de classificação deste pedido, no entanto este não chega a ser um problema decisivo uma vez que mesmo em havendo unidade de invenção não raras vezes os pedidos são classificados em diversas áreas. Segundo Luiz Guilherme de Loureiro[6] também justifica a divisão de pedido por uma razão financeira “duas patentes incluídas num único título implicaria sonegação de taxas”.
Michel Vivant também destaca que a principal motivação para aplicação do critério de unidade de invenção (unité d’ invention) é de natureza fiscal, a fim de evitar que o depositante escape ao pagamentos de taxas grupand várias invenções artificialmente sob um mesmo pedido sem que haja uma conexão real entre estas invenções. [7] Da mesma forma Pollaud Dulian destaca questões de ordem prática e fiscal para exigência de unidade de invenção de um pedido de patente[8]. Pouillet destaca aspectos de ordem fiscal para rejeição de patentes consideradas “complexas” ou seja, envolvendo diferentes objetos principais e cita argumento de Bédarride: “as patentes constituem um privilégio, e os privilégios não podem ser adquiridos sem que se cumpram as condições expressamente previstas”. Decisão do Tribunal de Rouen de 1863 observa que as condições de nulidade são listadas de form limitativa pela legislação de modo que o vício de complexidade por não estar expressamente listado na lei não poderá fundamentar a nulidade da patente.[9] Paul Mathély destaca que o conceito de unidade de invenção atende a razões de ordem prática pois um pedido limitado a uma invenção facilita o exame, e em segundo lugar sobretudo devido a razões de ordem financeira pois ao pagar apenas taxas de um pedido para proteger duas invenções distintas o requerente está causando um prejuízo ao funcionamento do sistema.[10]
François Panel destaca três razões comumente utilizadas para justificar a divisão de um pedido por parte do escritório de patentes: aspectos financeiros (necessidade de se manter pagamentos de depósito, pedido de exame e anuidades distintas para cada invenção), aspectos documentais (ter áreas técnicas díspares em um mesmo pedido dificulta a indexação e classificação deste pedido) e aspectos administrativos (a presença de áreas tecnológicas distintas dificulta o exame e exige exame de examinadores distintos para cada área). Para François Panel é inaceitável que um aspecto financeiro possa ter influência sobre uma decisão de exame que pode levar ao indeferimento do pedido, uma alternativa seria ajustar as taxas para estas situações, ou seja, identifica a presença de outras unidades de invenção seriam aplicadas uma outra tabela de taxas. Quanto ao aspecto administrativo com o avanço cada vez maior das técnicas de indexação este fator tende a diminuir. No passado o pedido classificado em múltiplas áreas tinha que ser armazenado em diferentes pastas o que constituía uma redundância no armazenamento. Quanto as aspectos administrativos François Panel argumenta que na atualidade as invenções cada vez mais são o resultado de equipes de P&D que agregam diferentes especialidade, e é natural e inevitável que o exame de patentes reflita esta tendência. [11] Ademais, nota François Panel que não há na Convenção Europeia de patentes um critério normativo em matéria de unidade de invenção, lacuna que muito dificilmente será preenchida pela jurisprudência.



[1] If little or no additional search effort is required, reasons of economy may make it advisable for the examiner, while making the search for the main invention, to search at the same time, despite the nonpayment of additional fees, one or more additional nventions in the classification units consulted for the main invention. The international search for such additional inventions will then have to be completed in any further classification units which may be relevant, when the additional search fees have been paid. This situation may occur when the lack of unity of invention is found either a priori or a posteriori. item 10.64 de PCT International Search and Preliminary Examination Guidelines, PCT Gazette, Special Issue, WIPO, 25 março 2004, S-02/2004
[2] Manual de Redação de Patentes da OMPI, IP Assets Management Series, 2007, p.195
[3] When is a search not a search ? part 2 – non-unity, the EPO approach, Jeremy Scott, Sytse de Jorge, World Patent Information, 2008, v.30, p.205
[4] Tratado de Propriedade Industrial, v.II, tomo I, parte II, p.155, n.80, apud Direito Industrial – patentes, Douglas Gabriel Domingues, Rio de Janeiro:Forense, p. 176
[5] SOARES, Tinoco. Tratado da Propriedade Industrial: patentes e seus sucedâneos. São Paulo; Ed. Jurídica Brasileira, 1998, p.308
[6] A Lei de propriedade industrial comentada, Luiz Guilherme de Loureiro, São Paulo:Lejus, p. 81
[7] VIVANT, Michel. Le droit des brevets, Dalloz:Paris, 2005, p. 66
[8] POLLAUD-DULIAN, Frédéric , Propriété intellectuelle. La propriété industrielle, Economica:Paris, 2011, p.243
[9] POUILLET, Eugène. Traité Theorique et Pratique des Brevets d'Invention et de la Contrefaçon. Marchal et Bilard:Paris, 1899, p.162
[10] MATHÉLY, Paul. Le droit européen des brevets d'invention, Journal des notaires et des avocats:Paris, 1978 p.196
[11] PANEL, François. La protection des inventions en droit européen des brevets. Collection du CEIPI, Paris:Litec, 1977, p.88